O conceito do cybertribalism
Nos anos 80 e 90, o conceito de Neotribalismo surgiu tanto no campo sociológico quanto na cultura das tatuagens. Na sociologia, o termo, popularizado por Michel Maffesoli, refere-se à maneira como as pessoas começaram a formar “tribos” baseadas em interesses compartilhados, ao invés de classes sociais ou grupos tradicionais. Ao mesmo tempo, na comunidade da tatuagem, artistas como Leo Zulueta e Ed Hardy apresentaram o termo “New-Tribalism” na revista Tattoo Time para descrever o ressurgimento e a reinvenção das tatuagens tribais na cultura ocidental. Ambos os conceitos refletem uma busca por pertencimento e conexão, mas de maneiras muito diferentes.
Agora, no século XXI, estamos vendo uma nova evolução desses conceitos, tanto no campo sociológico quanto no artístico. Esse movimento é o Cybertribalism, ou, cybertribalismo em português.
Diferença entre o Neotribalismo Sociológico e o Neotribalismo das Tatuagens
Neo-Tribos
O NeoTribalismo sociológico surgiu como uma resposta à dissolução das estruturas sociais tradicionais. Ele envolvia a criação de tribos urbanas que não eram baseadas em parentesco ou geografia, mas sim em identidades culturais, estéticas e comportamentais. Esse conceito, popularizado por Michel Maffesoli, refletia a formação de comunidades temporárias ou fluídas, que se reuniam em torno de interesses compartilhados, como música, moda e ideologia, sem depender de instituições tradicionais.
Alguns exemplos de tribos urbanas do final dos anos 70 e 80 incluem:
•Punks: Rejeitavam a cultura mainstream, com forte apelo ao “faça você mesmo” e atitudes antissistema.
•Góticos: Com influência de estilos românticos e sombrios, baseados em mitologias escuras e estética vitoriana.
•Ravers: Associados à música eletrônica, à cultura das raves e à filosofia PLUR (Peace, Love, Unity, Respect).
•Skinheads: Originalmente ligados à cultura operária britânica e ao reggae, com ramificações políticas e ideológicas variadas.
Neotribal tattoos
Por outro lado, no mundo da tatuagem, o Neo-Tribalismo representava o retorno dos desenhos tribais, não no sentido de recriação dos símbolos tradicionais das tribos indígenas, mas como uma nova expressão artística que misturava a estética ancestral com a contemporaneidade. Leo Zulueta, um dos principais nomes desse movimento, reinterpretou essas formas, de forma inovadora nas tatuagens ocidentais.
Além de sua estética única, as tatuagens neo-tribais representam uma busca por pertencimento e uma maneira de reviver a conexão com raízes culturais ancestrais em um contexto moderno e ocidental. O NeoTribalismo na tatuagem também serviu como uma resposta à alienação crescente da modernidade, funcionando como uma forma de reconectar as pessoas a algo maior que o próprio indivíduo.
O Que é o CyberTribalism?
O CyberTribalism pode ser visto como a evolução natural do NeoTribalismo, mas com um foco totalmente diferente. Enquanto o NeoTribalismo sociológico refletia a busca por pertencimento no mundo contemporâneo dos anos 90, o CyberTribalismo surge no contexto digital e globalizado dos tempos atuais, onde as tribos se formam em espaços virtuais, conectadas por estéticas e interesses culturais compartilhados.
A estética cyberpunk, muito presente no CyberTribalism, reflete o mundo em que vivemos, marcado pela interação entre o homem e a máquina, a tecnologia avançada e o controle corporativo, como previsto por autores como William Gibson. No CyberTribalismo, essa união de tribalismo e cyberpunk representa a interseção entre o ancestral e o digital como a nossa nova forma de viver em sociedade.
A Era Cyberpunk e a Tatuagem
Vivemos em um período que já pode ser considerado o início da era cyberpunk. As tatuagens, especialmente no contexto do CyberTribalismo, não estão limitadas apenas ao estilo cybertribal. Além dos estilos cyber-tribais discutidos nas últimas matérias, outros tipos de tatuagens futurísticas estão surgindo, como os designs figurativos com estética sci-fi (ficção científica), membros robóticos, e designs que simulam fios e circuitos pelo corpo.
Além disso, o CyberTribalismo também abrange a moda, artistas como o stylist Futurist, que está sendo uma forte influência com suas criações de roupas cyberpunk. Assim como o NeoTribalismo se manifestou na cultura visual e na moda dos anos 90, o CyberTribalismo está expandindo suas fronteiras para muito além da tatuagem, influenciando várias outras formas de arte e expressão.
O CyberTribalismo é um movimento que está crescendo rapidamente e o que vemos hoje é a formação de novas “tribos” baseadas em interesses estéticos futuristas, tecnológicas e simbólicas, conectadas através de referências culturais compartilhadas e de uma nova era digital.
O Impacto das Redes sociais na vida dos tatuadores
Além de refletir a estética futurística e tribal, o CyberTribalismo também mostra como essas novas formas de arte se espalham no ambiente digital. As redes sociais, especialmente o Instagram, tornaram-se essenciais para tatuadores e artistas autorais que trabalham com estilos únicos e de nicho, ainda pouco conhecidos.
Diferente de tatuadores de estúdios comerciais, onde o fluxo de clientes da rua é muitas vezes voltado para estilos convencionais, os artistas underground que fazem parte dessa nova vertente dependem da visibilidade nas plataformas digitais para alcançar um público que realmente busca suas expressões artísticas únicas.
A internet, especialmente o Instagram, tornou possível que esses artistas conectem-se diretamente com um público-alvo espalhado pelo mundo. Assim, esses tatuadores conseguem fechar suas agendas mensais mesmo com estilos extremamente específicos, algo que seria muito mais difícil sem as redes sociais.
O Processo de Criação na Era Digital
O processo de criação da arte também foi transformado pela tecnologia. Durante a era do NeoTribalismo, os tatuadores dependiam do papel, lápis e borracha para criar seus desenhos. Hoje, ferramentas digitais como iPads e softwares como o Procreate ou Adobe Illustrator permitiram que os artistas otimizem seu processo criativo. Essas ferramentas oferecem possibilidades infinitas, como a criação de camadas, paletas de cores infinitas e a facilidade de ajustes rápidos, algo que anteriormente demandaria tempo e materiais caros no processo manual.
Por outro lado, essa transformação digital também elevou o valor dos trabalhos manuais. O “faça você mesmo” permanece relevante, e muitos artistas ainda preservam a criação em papel, especialmente para estudos e treinamentos. Essa dualidade entre o analógico e o digital é o que enriquece o movimento, permitindo que o passado e o futuro coexistam, não apenas esteticamente, mas também nas práticas criativas. Tatuadores que dominam tanto o digital quanto o manual estão na linha de frente da revolução artística atual, contribuindo para a evolução do que chamamos de cyber-arte.
O movimento do cybertribalism está sendo construído agora por artistas independentes e coletivos underground, que, através das redes sociais e plataformas digitais, têm conseguido difundir suas ideias e criações para um público global. Embora muito já tenha sido feito, ainda há um longo caminho a percorrer, e a participação de mais artistas e estudiosos é essencial para continuar expandindo e fortalecendo essa comunidade.
A medida que mais criadores compartilham suas visões e conhecimentos, o CyberTribalismo vai se enriquecendo e evoluindo. Contudo, ainda falta um pouco de compartilhamento de informações e, muitas vezes, tempo para a reflexão sobre a nossa realidade. Talvez este seja o momento de mais artistas darem o primeiro passo para falar sobre isso, contribuindo para um entendimento mais profundo de onde estamos e para onde estamos indo.